Imagine uma sociedade limitada em que um sócio começa a agir em prejuízo da empresa, seja por falta de comprometimento, concorrência desleal, ou má gestão. Em muitos casos, o contrato social não prevê expressamente a possibilidade de exclusão desse sócio, deixando os demais em um impasse complexo. Como resolver essa situação sem recorrer a processos judiciais demorados e custosos? A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), publicada em abril de 2025, trouxe uma resposta inovadora: a exclusão extrajudicial de sócio é válida mesmo sem previsão contratual.
Esse entendimento representa um marco no direito societário brasileiro, pois amplia a autonomia dos sócios para gerirem seus negócios de forma mais eficiente, evitando que conflitos internos paralisem a empresa. Neste artigo, vamos analisar os fundamentos dessa decisão, suas implicações práticas, os procedimentos recomendados e os cuidados jurídicos necessários para aplicar a exclusão extrajudicial com segurança.
O que é exclusão extrajudicial de sócios?
A exclusão extrajudicial de sócios consiste no procedimento pelo qual os demais sócios removem um membro da sociedade limitada sem a necessidade de ajuizamento de ação judicial. Tradicionalmente, esse mecanismo dependia da existência de cláusulas expressas no contrato social que autorizassem tal prática, o que limitava sua aplicabilidade e deixava o caminho judicial como única alternativa para resolver o conflito.
Agora, com o posicionamento do STJ, a exclusão extrajudicial pode ser realizada com base nos princípios gerais do direito societário e na autonomia da vontade dos sócios, desde que respeitados os direitos do sócio excluído e observados os requisitos legais para configuração da justa causa. Essa nova interpretação contribui para a agilidade na resolução de disputas internas, redução de custos e preservação da continuidade do negócio.
Análise da decisão do STJ
No julgamento emblemático, o STJ afirmou que a ausência de cláusula no contrato social não impede a exclusão extrajudicial do sócio por justa causa. O tribunal fundamentou sua decisão em diversos pontos:
- Princípio da Autonomia da Vontade: Os sócios têm liberdade para organizar a sociedade e tomar decisões que visem à proteção do interesse social, desde que em consonância com a lei.
- Proteção da Sociedade e Demais Sócios: O direito societário visa garantir o equilíbrio e a continuidade da empresa, evitando que a permanência de um sócio nocivo comprometa o patrimônio e a reputação da sociedade.
- Jurisprudência e Doutrina: A exclusão judicial sempre foi admitida nos casos de justa causa, mas a exclusão extrajudicial, por sua celeridade e menor custo, deve ser incentivada quando observados os requisitos legais.
- Precedentes sobre Dissolução Parcial e Responsabilidade dos Sócios: O Código Civil, em seus artigos 1.004, 1.026, 1.030 e 1.085, disciplina a exclusão e dissolução parcial, impondo limites e garantias que devem ser respeitados, mas sem restringir a exclusão extrajudicial quando justificada.
Essa decisão do STJ consolida uma tendência de flexibilização das regras societárias, adaptando-as às necessidades práticas do mercado e reforçando a importância da boa-fé, transparência e proteção ao sócio excluído.
Contexto legal e societário
Sociedade limitada e responsabilidade dos sócios
A sociedade limitada é uma das formas societárias mais utilizadas no Brasil devido à segurança que oferece aos sócios, cuja responsabilidade pelas obrigações da sociedade é limitada ao valor de suas quotas (art. 1.052 do Código Civil). No entanto, existem exceções a essa limitação, como nos casos de fraude contra credores, ou quando a justiça do trabalho busca proteger o empregado, não aplicando a limitação da responsabilidade (conforme jurisprudência consolidada).
Além disso, o Código Civil proíbe que sociedades sejam compostas exclusivamente por marido e mulher em alguns regimes de bens, para evitar fraudes contra o direito de família (art. 977 do CC).
Exclusão de sócios: causas e procedimentos
O Código Civil lista diversas causas que autorizam a exclusão do sócio, como:
- Mora no cumprimento de obrigações sociais (art. 1.004)
- Descumprimento de obrigações contratuais ou legais (art. 1.030)
- Atos que coloquem em risco a continuidade da empresa (art. 1.085)
A exclusão pode ser:
- Extrajudicial, mediante deliberação dos demais sócios e alteração contratual, em casos como o remisso (art. 1.004 do CC);
- Judicial, quando houver falta grave não prevista para exclusão extrajudicial (art. 1.030 do CC).
Anteriormente, a exclusão extrajudicial dependia da previsão expressa no contrato social para ser válida. Caso contrário, o sócio prejudicado poderia contestar a exclusão, alegando nulidade.
Impactos práticos da decisão do STJ
Agilidade na gestão e resolução de conflitos
Com a decisão do STJ, as sociedades limitadas ganham um instrumento mais ágil para remover sócios que, por exemplo, atuam contra os interesses da empresa, não contribuem para o desenvolvimento do negócio ou praticam atos prejudiciais. Sem a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para cada caso, os demais sócios podem agir rapidamente para preservar a saúde financeira e operacional da empresa.
Segurança jurídica e previsibilidade
Embora o contrato social não precise mais conter cláusula específica, a exclusão extrajudicial deve respeitar os requisitos legais, garantindo o direito à ampla defesa e o quórum necessário para aprovação da exclusão. Isso cria um ambiente de maior segurança jurídica, pois diminui o risco de anulações futuras e litígios prolongados.
Incentivo à boa governança corporativa
A possibilidade de exclusão extrajudicial fomenta a adoção de práticas de governança que previnem conflitos e promovem a transparência entre sócios. Empresas tendem a revisar seus contratos sociais, estabelecer regras claras para exclusão e comunicação interna eficiente, fortalecendo a confiança e o compromisso entre os membros.
Procedimentos e requisitos para a exclusão extrajudicial
Para que a exclusão extrajudicial seja válida e eficaz, devem ser observados alguns passos essenciais:
- Verificação da Justa Causa: É imprescindível que haja motivo legal ou justificável para a exclusão, conforme previsto no Código Civil e jurisprudência consolidada.
- Assembleia dos Sócios: A decisão deve ser tomada em reunião ou assembleia, com a observância do quórum previsto no contrato social ou, na ausência deste, da legislação vigente.
- Direito à Defesa: O sócio que será excluído deve ser notificado previamente para apresentar sua defesa, garantindo o contraditório.
- Formalização da Decisão: A exclusão deve ser registrada em alteração contratual e arquivada na Junta Comercial, tornando-a pública e eficaz contra terceiros.
- Apuração e Pagamento dos Haveres: Após a exclusão, deve-se proceder à apuração do valor da quota do sócio excluído, com base em balanço patrimonial especial, conforme previsto no art. 1.026 do Código Civil, e seu pagamento dentro do prazo legal.
- Assessoria Jurídica Especializada: Por se tratar de procedimento complexo e com potenciais consequências jurídicas, recomenda-se acompanhamento profissional para evitar nulidades e litígios.
Riscos e cuidados jurídicos
Apesar da aprovação do STJ, a exclusão extrajudicial não é um procedimento isento de riscos. Os principais cuidados a serem observados são:
- Ausência de Abusos: A exclusão deve respeitar os direitos do sócio excluído, não podendo ser utilizada como instrumento de perseguição ou abuso de poder.
- Transparência e Comunicação: Falhas na comunicação e ausência de notificação podem gerar ações judiciais por danos morais, materiais ou nulidade da exclusão.
- Revisão Contratual: Sociedades com contratos sociais omissos devem aproveitar para implementar cláusulas claras sobre exclusão, quórum e regras de governança.
- Evitar Conflitos Desnecessários: A exclusão deve ser medida de última instância, após tentativas de resolução consensual e diálogo entre os sócios.
Recomendações para empresários e advogados
Para empresários
- Revisem e Atualizem o Contrato Social: Incluam cláusulas que regulem a exclusão de sócios, quóruns para deliberações e procedimentos para apuração de haveres.
- Adotem Práticas de Governança Corporativa: Promovam transparência, comunicação eficaz e resolução amigável de conflitos.
- Busquem Assessoria Jurídica Preventiva: Consultar advogados especializados pode evitar problemas futuros e garantir segurança nas decisões societárias.
Para advogados
- Orientem Sobre os Requisitos Legais: Esclareçam aos clientes a necessidade de justa causa, direito de defesa e formalidades para exclusão.
- Negociem Soluções Extrajudiciais: Encorajem a mediação e o consenso antes de buscar a exclusão.
- Acompanhem Atualizações Jurisprudenciais: Estejam atentos às novas interpretações e decisões que impactam o direito societário.
Conclusão
A decisão do Superior Tribunal de Justiça que reconhece a validade da exclusão extrajudicial de sócios em sociedades limitadas, mesmo sem previsão no contrato social, é um avanço significativo no direito empresarial brasileiro. Ela alia agilidade e segurança jurídica, oferecendo uma alternativa eficaz para resolver conflitos societários, proteger o patrimônio social e garantir a continuidade dos negócios.
Essa flexibilização exige, contudo, rigor na observância dos direitos dos sócios e no cumprimento dos procedimentos legais, por meio de atendimento jurídico qualificado. Empresários e advogados têm agora a oportunidade de fortalecer a estrutura das sociedades limitadas, tornando-as mais resilientes e preparadas para os desafios do mercado.
Quer proteger sua empresa e evitar conflitos? Agende uma consultoria jurídica especializada em direito societário com a justa.Legal e assegure a melhor estratégia para a sua sociedade limitada.


